Aqui há atrasado, uma amiga descrevia-me uma interessantíssima viagem ao México. Descansar, dizia ela. Não dei o meu habitual berro de espanto ao ouvir uma cidadã dizer que andar vinte horas de avião, mais umas tantas de carro e enfiar-se num lugar com umas centenas de turistas mais as criancinhas histéricas é considerado descansar. Estava sol, o Porto tinha ganhado e assim sendo a minha disposição permitia-me ouvir os mais lancinantes disparates sem me encanitar todo.
Depois das habituais histórias sobre as magníficas praias e os muito simpáticos americanos que tinha conhecido, relatou-me o ponto alto da viagem.
Tinha ido à selva, ou a um sítio parecido cheio de árvores e bichos, visitar uma tribo que, segundo ela, ainda vivia como há mil e tal anos atrás.
Vivem do que a terra lhes dá, sem electricidade, telefones, televisão, carros, escolas hospitais, enfim, longe de todos essas invenções infernais. Aqueles privilegiados estão em comunhão com a natureza o que lhes dá uma felicidade sem limites. Mas, sobretudo, não sofrem da mais terrível doença do homem moderno: o stress.
Nesta altura comecei a achar que a conversa poderia estar a ir para um ponto em que a minha chávena de café se podia tornar num perigoso objecto de arremesso.
No meu dicionário, stress vem associado a ansiedade, nervosismo, tensão. Ora, não me parece que um tipo que ande descalço, com as vergonhas cobertas com uma folha de palmeira e que se tenha de defender de cobras e outros antipáticos animais apenas armado com uns pauzitos e umas pedras não sofra de ansiedade. Também não consigo perceber assim muito bem que um homem não fique ligeiramente nervoso por não ter maneira de tratar uma constipação. E nem falemos de casas de banho: eu acho que ficaria bastante stressado se tivesse de fazer cocó no meio de milhões de insectos. Manias, às tantas. Mas ou muito me engano ou era coisa para me deixar gago ou com prisão de ventre para o resto dos meus dias.
Claro está, a minha amiga pode pensar que há stress bom e mau. Um tipo meter-se num carro, estar sentado no quentinho, a ouvir música, e passada uma hora chegar ao emprego onde está oito ou dez horas para poder comprar disparates como educação para os filhos, umas meias para o frio, papel higiénico, é stress mau. Já passar um dia a andar descalço de lança na mão a caçar bichos sem sequer saber se vai poder dar de comer às crianças, deitar-se no chão debaixo duma palhota e estar à mercê de todas as doenças do simposium é stress bom.
Eu cá gosto do stress mau. Gostos. Gosto tanto que até adoro os maiores símbolos dessa magnifica doença: os SPAs.
Os Spas são fantásticos porque respeitam o stress. Sabem tão bem que ele é vital para as nossas vidas que nos preparam para cada vez mais nervosismo, luta e demais maçadas. A malta vai lá e relaxa, para na semana seguinte nos podermos enervar ainda mais. “Ahhh, estive no Spa de Ferrão Ferro e vim de lá com as pilhas carregadas”. E para que servirão as tais pilhitas? Pois claro, para as gastarmos em stress.
Publicado no suplemento LIFE do DN de dia 26 de Maio